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Documentário “Bep Kororoti: O Olho que Tudo Vê”, o olhar Kayapó sobre o território
Guardiã ao mesmo tempo de dois biomas, o cerrado e a floresta, e cercada pela monocultura e por pressões como a extração ilegal de minérios e madeira, a Terra Indígena Capoto-Jarinã fica no norte do Mato Grosso. É nesse contexto que o documentário “Bep Kororoti: O Olho que Tudo Vê”, foi pensado e realizado, mostrando o cotidiano da aldeia Kapot, que reúne atualmente 600 pessoas. A produção da Associação Cultural Indígena Kapot Jarinã (ACKJ) foi contemplada pelo 5º ciclo do Fundo Kayapó e une tradição e tecnologia para reafirmar o protagonismo indígena na defesa de seus territórios através da narrativa audiovisual.
Entre anciãos, mulheres e jovens, mais de 20 pessoas participaram das gravações feitas na aldeia. As entrevistas registraram histórias transmitidas de geração em geração e revelaram estratégias de proteção e monitoramento com o território. Para Betikre Tapayuna Metuktire, comunicador, jovem liderança e produtor do filme, o envolvimento da aldeia foi essencial. “A comunidade toda está envolvida no documentário — fazendo captação de imagens, tradução, contando as histórias do povo. Isso me deixa muito feliz”, diz Betikre.
Segundo ele, a ideia do filme nasceu em 2019, durante as mobilizações indígenas contra o Marco Temporal. “Queremos mostrar como mantemos nosso conhecimento tradicional e como os povos indígenas preservam suas terras, rios e nascentes. É um filme demonstrativo do que já fazemos para proteger o território e manter viva a cultura dos mais velhos, que passam os saberes aos mais jovens”, explica.
A utilização da tecnologia como ferramenta de monitoramento e proteção do território é outra frente de proteção lembrada por Betikre abordada no filme. Um exemplo é o uso de um aplicativo via celular, o SOMAI (Sistema de Observação e Monitoramento da Amazônia Indígena), que monitora o território emitindo alertas quando ocorrem invasões ou incêndios nos arredores de sua aldeia. “Para quem ataca nossos direitos ou não conhece os povos indígenas, é importante ver como trabalhamos em defesa do território e como usamos as tecnologias para proteger”, completa.
No documentário, Betikre também aparece diante das câmeras como um dos entrevistados. “Essa é uma ferramenta para proteger e denunciar. É um filme muito forte, que traz nossas histórias que queremos mostrar para o mundo”, afirma.
A direção e edição ficaram a cargo de Arewana Yudja, comunicador indígena Yudja, que assumiu o desafio de transformar as narrativas Kayapó em uma linguagem audiovisual.“São 20 personagens entre lideranças antigas e jovens, incluindo mulheres e comunicadores. Queríamos mostrar a realidade da aldeia Kapot e a força do território, que abriga dois biomas — a floresta e o cerrado. Mostrar onde e como o povo mora, planta, procura suas medicinas”, explica Arewana.
Ele conta que o processo de filmagem foi desafiador, devido à distância e à falta de energia na aldeia. “Demora para fazer um documentário. Não dá para fazer de qualquer jeito. A gente pensa em tudo, escolher a música para combinar as imagens com o sentimento do povo. Mesmo sem falar a língua mebêngôkre, conseguimos trabalhar juntos. Foi uma experiência muito importante trabalhar com os parentes.”
“Bep Kororoti: O Olho que Tudo Vê” parte do olhar dos próprios Kayapó sobre sua vida e território. O filme mostra como a comunicação tem se tornado uma das principais estratégias de defesa cultural e ambiental dos povos indígenas. Entre as lentes e a floresta, os jovens comunicadores da T.I. Capoto-Jarinã constroem uma ponte entre o passado e o futuro, transformando o cinema em instrumento de transmissão de saberes através da tradição oral, uma nova forma de contar histórias, de preservar e resistir.
